filmes, literatura

Se eu fechar os olhos agora

Esse ano o prêmio Jabuti deu muito o que falar. Aproveitei para ler esse livro, de Edney Silvestre, que parece ser alguém famoso do jornalistmo da rede Globo.

Dois meninos crescendo nos anos 60, investigando a morte de uma mulher. Um pouco policial, um pouco histórico. Há um certo stream of consciousness, mas sem dificultar a leitura como acontece pra mim com James Joyce. Tem 300 páginas, mas é um livro curto, já que há bastante espaço em branco nos rápidos (e divertidos) diálogos. Muitas vezes os dois meninos-detetives são uníssonos no diálogo ou se completam, como neste, em que Eduardo começa, e Paulo sempre meneia a cabeça:

– Nós sabemos que não somos crianças…
– Não somos.
– Mas vocês adultos acham que somos.
– Acham.
– Agorinha mesmo o senhor nos chamou de meninos.
– Chamou.

Lembrou-me dos dois palhaços do Inpetor Geral de Gogól. Diálogos bonitos e que remetem ao companheirismo pueril, com um toque de O Gênio do Crime. Curiosamente os protagonistas, juntos, foram meu nome: Paulo e Eduardo. Coincidências menores que essas seriam o suficiente para impactar a minha leitura.

Algumas vezes os meninos conversam como adultos. Isso me incomoda bastante: tirar a verossimilhança que está sempre presente nas obras que gosto. Parecido com Kolia e seus amigos em Irmãos Karamazov. Talvez eu veja Dostoiévski em tudo. Melhor: vejo tudo em Dostoiévski, como todo bom pseudointelectual. Em outros momentos são usadas palavras que eu diria serem modernas, ou ainda comparações contemporâneas, como dizer que uma situação é pior que um “melodrama mexicano”. Por mais que possa ser verídico (não sei se é), já eram famosas e melosas as novelas mexicanas em 1960? E o fim do livro é um melodrama, no bom sentido, dando nó na garganta: “Se eu tivesse um irmão, queria que fosse você“.

Leitura fácil e agradável. A parte investigativa tem o estilo que eu gosto: não é como Holmes que deduz tudo e só revela no final o raciocínio, mas também é mais rápido que Poirot. Por diversas vezes o texto pula alguns momentos que se tornariam óbvios, e você mesmo faz a ligação entre o que aconteceu entre uma passagem a outra.

Lendo a contra capa Luiz Ruffato diz que “o corpo de Anita é transubstanciado no corpo do Brasil“. Não gosto de interpretações mirabolantes, mas talvez o autor queira mesmo mostrar algo assim, já que diz “nada neste país é o que parece! E esta cidade é um microcosmo do Brasil“. Em diversas ocasiões, os personagens, no meio da investigação, reclamam ou elogiam a ditadura, Getúlio, Jãnio e Juscelino. Poderia ser uma abordagem interessante, mas essas discussões aparecem em pontos que, na minha opinião, não se encaixam. O livro continuaria bom sem essa “profundidade”, prefiro as referências a filmes e outros fatos que o livro também faz.

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